Uma das contribuições da psicologia humanista é a obra de Carl Rogers.
Carl Rogers nasceu em 8 de janeiro de 1902 em Oak Park, Illinois, EUA e faleceu em 4 de fevereiro de 1987 em La Jolla, Califórnia, EUA. Formado pela Universidade de Wisconsin, obteve seu mestrado e doutorado em 1931 na Teachers College da Universidade de Columbia. Lecionou na Universidade de Rochester de 1935 a 1940 e na Universidade Estadual de Ohio de 1940 a 1945. Rogers também foi professor de psicologia na Universidade de Chicago de 1945 a 1957 e na Universidade de Wisconsin de 1957 a 1963. No ano de 1963, Rogers se mudou para La Jolla, Califórnia, onde ajudou a fundar e tornou-se um membro residente do Center for Studies of the Person.
Rogers construiu a abordagem centrada na pessoa, terapia de viés humanista e que valoriza a experiência subjetiva do cliente.
Da obra de Husserl, Rogers assimila a ideia de que a experiência humana deve ser entendida em seus próprios termos: “O cliente é a única pessoa que pode compreender sua própria experiência. O terapeuta deve ajudar o cliente a explorar sua experiência, mas não pode interpretar ou explicar a experiência para o cliente.” (ROGERS, 1951, p. 22)
Carl Stumpf, psicólogo alemão e orientador de Husserl, estudou a percepção e a consciência, e Abraham Maslow, psicólogo norte-americano e um dos fundadores da psicologia humanista, foram outras referências fundamentais para Carl Rogers, como também o existencialismo de Sören Kierkegaard e a teoria da compreensão de Wilhelm Dilthey.
De acordo com Maslow,
“a psicologia humanista é, no seu sentido mais verdadeiro, uma visão geral e abrangente da vida, uma visão mundana de uma filosofia de vida que não é simplesmente intelectual mas é também um sistema de ética, de valores, de política, de economia, de educação e de religião; uma filosofia de ciência.” (MASLOW, 1972 apud MORATO, 1987).
Nas palavras de Morato, a “psicologia humanista, ao invés de uma teoria específica, é mais uma atitude dirigida a um melhor entendimento do homem” (MORATO, 1987).
Segundo Kierkegaard, os seres humanos são indivíduos, que são responsáveis por suas ações e escolhas, em que podem escolher entre o bem e o mal em liberdade. Para Kierkegaard o indivíduo é único, como são únicas suas experiências (KIERKEGAARD, 2010, 2022; FEIJOO e PROTASIO, 2011). Dilthey, por sua vez, enfatiza a importância da compreensão a partir do ponto de vista do outro. A experiência humana para Dilthey é única e deve ser entendida em seus próprios pontos de vista, cumprindo ao terapeuta ajudá-lo em seus objetivos e motivações (DILTHEY, 1988, 2013).
Podemos destacar a presença no trabalho de Rogers da autorregulação organísmica, teoria psicológica desenvolvida por Kurt Goldstein, que reconhece os organismos vivos como sistemas holísticos, que são mais do que a soma de suas partes, e que possuem um senso de autopreservação, que os guia no processo de seu desenvolvimento.
Outra influência que se pode citar é a de Martin Buber, especialmente a ideia de relação Eu-Tu. Carl Rogers acreditava que a relação terapêutica deve ser uma relação Eu-Tu, na qual o terapeuta se encontra com o cliente de forma genuína e aceitante: “A terapia é uma relação Eu-Tu, na qual o terapeuta se encontra com o cliente de forma genuína e aceitante.” (ROGERS, 1961, p. 22)
A clínica de Rogers evoluiu ao longo de sua vida, passando por estágios como a terapia não-diretiva, a psicoterapia reflexiva e a psicoterapia experimental. Rogers atribuía ao psicoterapeuta na terapia não-diretiva um papel de interesse, de aceitação e de acolhimento do cliente, referindo-se à importância de se estabelecer certo vínculo emotivo com o cliente (BELÉM, 2000; ROGERS, 1973). Rogers procura trabalhar com o cliente no reconhecimento de suas forças e na aceitação de suas debilidades (BELÉM, 2000; ROGERS, 1973). Lida com o ‘insight’, que define como uma forma de ajudar o cliente a perceber melhor as relações em que participa e suas experiências.
A abordagem centrada na pessoa de Rogers enfatiza o papel da experiência pessoal na compreensão da existência, tendo o relacionamento terapêutico como vetor para a construção da mudança pessoal, em um ambiente de aceitação e de compreensão, destituído de julgamentos, em que o cliente precisa se sentir seguro para explorar seus sentimentos, pensamentos e o desenvolvimento de seu potencial.
O terapeuta na perspectiva clínica de Rogers deve estar aberto ao encontro, com aceitação incondicional do cliente, em que a experiência terapêutica deve ser permeada por acolhimento e empatia.
Ao invés de olhar o cliente como um sujeito do comportamento ou o produto das expressões do inconsciente, Rogers o reconhece como alguém que é mais do que sua queixa, alguém que se autorregula e se atualiza, em cujo processo de compreensão de experiências pode conquistar segurança, aceitação e desenvolver seu potencial.
De acordo com Morato (1987), em todos os trabalhos Carl Rogers considera o outro como uma pessoa e a relação de ajuda como a possibilidade dessa pessoa crescer. Importa frisar que a relação de ajuda não se trata da ajuda do senso comum, onde o demandante pede e o outro o atende em seu pedido, mas de um apoio que é oferecido pelo terapeuta para que o próprio cliente consiga, através do reconhecimento e do uso de seus próprios recursos, realizar suas mudanças e crescimento.
Rogers enfatiza a potência do contato entre terapeuta e cliente, em que o terapeuta adota atmosfera facilitadora, conduzindo o cliente como pessoa e não como especialista, apoiando-se no postulado de que o homem tem a tendência para o crescimento e o desenvolvimento de suas potencialidades próprias, em um processo inato, uma tendência, a tendência atualizadora, direcionada para o crescimento (MORATO, 1987). Segundo Rogers, a tendência atualizadora confere ao organismo a “sabedoria” de buscar os meios adequados para o seu desenvolvimento (MORATO, 1987).
Na perspectiva de Rogers, mais do que aplicar um método, cabe ao terapeuta construir um ambiente de acolhimento, de escuta com empatia e compreensão autênticas, de aceitação positiva e incondicional do cliente, com vistas a maior integração deste consigo mesmo, com o mundo, seu crescimento e suas relações.
Referências
BELÉM, Diana M. H. Carl Rogers: do diagnóstico à abordagem centrada na pessoa. Recife: Bagaço, 2000.
BUBER, Martin. Eu e Tu (Ich und Du). São Paulo: Centauro, 2001 (1923).
DILTHEY, Wilhelm. Ideias para uma psicologia descritiva e analítica (Ideen über eine beschreibende und zergliedernde Psychologie). Rio de Janeiro: Via Verita, 1ª ed., 2013 (1894).
DILTHEY, Wilhelm. Introdução às ciências humanas (Die Geisteswissenschaften). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010 (1844).
DILTHEY, Wilhelm. Introduction to the human science (Die Geisteswissenschaften). Detroit: Wayne State Univ. Press, 1988 (1844).
FEIJOO, Ana Maria Lopez Calvo de; PROTASIO, Myriam Moreira. Análise existencial: uma psicologia de inspiração kierkegaardiana. Arq. bras. psicol., Rio de Janeiro , v. 63, n. 3, p. 72-88, 2011 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672011000400007&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 04 nov. 2023.
KIERKEGAARD, Sören. A doença para a morte (Sygdommen til Døden). Petrópolis, RJ: Vozes, 2022 (1849).
KIERKEGAARD, Sören. O conceito de angústia (Begrebet Angest). Petrópolis, RJ: Vozes, 2010 (1844).
MORATO, Henriette Tognetti Penha, Abordagem centrada na pessoa: teoria ou atitude na relação de ajuda? in ROSENBERG (Org.), Aconselhamento psicológico centrado na pessoa, São Paulo: EPU, 1987.
ROGERS, Carl. Psicoterapia e consulta psicológica (Client-Centered Therapy). São Paulo: Martins Fontes, 1973 (1951).
ROGERS, Carl. Tornar-se pessoa (On becoming a person). São Paulo: Martins Fontes, 1976 (1961).
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